– São 01h28… Estou cansado. Vou dormir.
– Já? É Natal! Desce… Estou passando aí!
– Não! Estou cansado… De verdade. Não estou muito bem…
– Seu apartamento é o …, né? Vou tocar esse interfone até você descer! Deixa de frescura!
Desci. Ela chegou 2 ou 3 minutos depois. Era puro ânimo e eu era puro “enfim”. Eu estava pensativo. Queria ficar sozinho. Precisava ficar sozinho.
– Então… Peguei várias sobras da casa da minha mãe… Quer comer alguma coisa?
– Algo doce. Acho que minha glicose está baixa…
– Serve rabanada?
Comi quieto. Fui sentindo uma onda de calor tomar o meu corpo. Vinho demais me dá sono e os goles da Ceia de Natal tinham me deixado mais introspectivo que de costume.
– Estava uma delícia! Sua mãe quem fez?
– Que nada! Beira Mar! Minha mãe está cansada… A idade pesa nesses momentos…
Havia uma pequena árvore de Natal em um canto cheia de cartões natalinos. Nem sabia que ainda existiam. Os Correios ainda entregam cartões de Natal em tempo ou seriam de 2019?
Ela acendeu um cigarro. Ofereceu-me um trago. Aceitei. Deu vontade de fumar. Coisa de momento.
– Então… Parece que as coisas não deram muito certo do lado de lá…
– Você sabe que não fui atrás dela… Ela veio atrás de mim. Talvez tenha vindo apenas porque eu estava com você. Talvez tenha vindo por maldade, não sei. A maneira que tudo terminou me dá náuseas! Fiz de TUDO para dar certo. Estou com a consciência absolutamente tranquila. Mas não quero mais falar disso – afirmei resoluto – É parte do meu passado. Algo que eu quero e vou esquecer.
– Não quero que fale disso. Eu só sinto. Sinto muito… Talvez seja difícil para você acreditar, mas é a verdade.
– Eu sei – foi o que saiu de meus lábios enquanto eu fitava o chão.
Ficamos em silêncio por alguns instantes. Peguei um cigarro para mim. Ela entrou e eu fiquei na varanda desperto pela nicotina, pensativo como antes. Incomodado de alguma forma e tentando entender o porquê de eu estar ali.
Ao longe, ouvi o barulho de uma lata se abrindo. Pensei que era uma cerveja ou algo parecido, mas era uma Coca Zero.
– Toma… Vai te fazer bem.
– Eu agradeço, mas no fundo estou precisando dormir…
– Já coloquei um travesseiro e um cobertor no sofá. O controle do ar está na mesinha de centro. Qualquer coisa, eu estou no meu quarto. Boa noite!
E após um beijo na na minha testa, ela entrou para dentro do quarto rapidamente. Fechou a porta. Fiquei surpreso. Não entendi nada. Tentei me acertar no sofá, mas algo me incomodava… Levantei-me e fui até o quarto dela. Bati na porta. Ela me disse para entrar.
– Por que você me trouxe até aqui? Da última vez que nos falamos eu fui claro que…
Ela se levantou abruptamente e pôs os dedos em meus lábios, me silenciando.
– Eu também não sei porque te procurei e menos ainda porque fui te buscar. Foi algo mais forte que eu. De alguma forma, é bom ter você por perto. As coisas não aconteceram do jeito que eu queria, mas você sempre foi 100% honesto comigo e isso é raro. Você tinha um sonho e foi atrás dele.
Fiquei em silêncio. Eu não sabia o que dizer.
– Ainda pensa nela?
– Não posso… Não devo… Não quero. Chega.
– Entendo. Não diga mais nada, então… Vá descansar. Levante esse cabeça! Você seguiu seu coração. Eu também sou assim… Eu também sigo o meu. Boa noite!
Dei nela um longo abraço, um abraço sentido. Pelas mãos, ela me levou até o sofá e me cobriu. Passou a mão na minha testa, me encarou por alguns segundos e retornou para o quarto.
Logo depois, fui fumar mais um cigarro. Tomei mais uma Coca Zero. Deitei-me no sofá da sala e revi uma série de fotos. Reli conversas. Revi contatos. Tudo era muito recente e ainda mexia muito comigo. E por fim, adormeci, mas não antes de apagar qualquer traço que fosse do meu celular. Removi do meu blog tudo que encontrei sobre ela. Tudo guardado em um local seguro que eu não visitaria nunca mais. Disso eu tinha certeza. Esse foi o presente que me dei de Natal.
Ao acordar, havia um bilhete em cima da mesinha de centro.
– Fui almoçar na casa de uma tia. Há mais rabanada na geladeira. Fique bem! Um beijo.
Escrevi um obrigado bem grande com minha caligrafia horrenda no tal bilhete. Não comi nada. Fui para casa e novamente adormeci. Ao acordar, escrevi esse texto, ainda sem entender tudo o que estava acontecendo. Havia muitas coisas acontecendo. O tempo vai colocar tudo no seu devido lugar. É com isso que eu conto. Vou seguir em frente, sem olhar para trás por um instante que seja. Jamais.