Mundo meia boca

Vivemos em um mundo onde ser bom e sincero causa espanto e desconfiança.

As pessoas simplesmente não acreditam mais na bondade e na sinceridade, ou mesmo em qualquer traço de pureza desinteressada. Acham que há algum tipo de manipulação envolvida. Algum tipo de toma lá, dá cá. Acham que o outro está materializando algum arquétipo angelical apenas para mostrar suas garras em um momento oportuno.

É um mundo que está conformado com a mediocridade e que acredita que o medíocre é, ao menos, real, possivel. A mediocridade se transformou, então, em uma espécie de pós novo normal.

E assim, o mundo vai se enchendo de relações medíocres, de momentos medíocres e descartáveis, de frases sem significado, de ideologias imbecilizantes e de mentiras que são repetidamente contadas olhos nos olhos, até chegarem ao ponto de serem reconhecidas como pós verdades. E as verdades, agora sim reconhecidas como mentiras, é que devem ser esquecidas e deixadas de lado.

O amor e tudo mais é líquido em um mundo que escorre por entre os dedos dos medíocres que já são o próprio mundo.

Mataram o mundo. Não sei como eu ainda não morri.

Mediocridade

É procurar no amor alguma certeza ou razão

É amar com um pé atrás

É amar com os pés no chão

 

É viver de aparências

É aparentar ser

É nunca ser nem causa e nem consequência

 

É prender o cabelo quando bate o vento

É não sair de casa porque acabou o filtro solar

É fazer cálculos a todo momento

 

É abraçar sem encostar o peito

É beijar sem usar a língua

É tentar fazer amor e não sentir qualquer efeito

 

É o poema vazio e plasticamente correto

É virar a cara para a “cara metade”

É achar erro no que está certo

 

É o quase, o quem sabe e o talvez

É viver a vida em marcha lenta

É querer entender todos os porquês

 

É matar o desejo e o sonho

É viver o tempo todo sorrindo

Com o coração sempre tristonho

 

Mas

Acima de tudo

A mediocridade é uma escolha:

É como ter em mãos uma preciosa garrafa de vinho

E nunca sacar a sua rolha.

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