Nunca me encalhei nos teus canais
Apesar deles serem rasos e apertados
Por demais.
Nunca me encalhei nos teus canais
Apesar deles serem rasos e apertados
Por demais.
Eu sou
O que está por detrás
Das portas que não abro
O que não encaro
Nas janelas que embaço
As músicas que não escuto
Os petiscos que não degusto
Os vinhos que não abro
As conversas que não tenho
Os sentimentos que ignoro
E tudo mais que disfarço
Eu estou
Sem sede
Sem fome
Entalado
Mofado
Abismado
Atordoado
Disperso
Possesso
Compresso
Inconfesso
Puto!
E mais nada
Eu estou
O reverso
Eu estou
Ao contrário
E diante
Desse corolário
Eu estou morto
Mas esse óbito –
Valha-me, Deus! –
É temporário.
Sabe o que é…
É que o céu está azul…
E daí?
E daí, nada…
É que
Por você
Tudo é
De alguma forma
Motivo.
Adoro ver esse sorriso
Em todos os teus lábios.
Falta-me inspiração
Porque nada me falta
Ou se me falta algo
Disso não me dei conta
Sinto-me estranho:
Sinto falta de sentir falta
Pois bem…
A plenitude e eu
Somos péssimos amigos
E ela só me visita
Quando eu não a procuro
E teima em aparecer
Quando não é chamada
Abusada!
Mas já que chegou do nada
Toma comigo um café
E aproveita a sua estada
Prometo trata-la bem
Ainda que não seja minha convidada.
Quando olho para meu passado
Percebo os momentos exatos
Em que fiz demais
Tentei demais
Falei demais
Demais…
Não mais!
Porque quem eu era
Já não mais sou
Mas ainda sou
E ainda sinto
Sinto muito
Ademais.
Admiro tanto os poetas
Ao ponto de não me considerar um
Leio coisas que me desnudam
Que desnudam os outros
Métricas, rimas
Tudo perfeito
Nem mais, nem menos
As coisas como são
Mas eu não sei como são as minhas coisas
Só sei que são
E talvez ser poeta seja isso –
Não sei –
Falar das coisas como as vejo
Como as sinto
Como com elas pelejo
E esse meu esforço pagão
Há de fazer sentido
Na vida, em algum vão perdido
Das minhas coisas como são
É uma forma de dizer –
E como eu preciso dizer –
Não sou em vão!
Feito vela que vejo acesa
Que traz você em sua chama
Ora sinuosa, ora imóvel
Me iluminando
Me queimando
Feito milhões de sóis
À luz desta vela eu sigo
Velando dia e noite
Ainda que sem voz
Até que a chama se apague
E tudo mais se cale
E fiquemos em definitivo a sós.
Sejamos claros:
Não é porque você não os tem
Que eu não os tenho
Tire seus sapatos –
Limpes suas patas –
Antes de adentrar na minha vida
Se for para chegar
Que chegue leve, suave
Cheirosa, aquosa
Despreocupada, apaixonada
Completamente nua
(minha e sua – nossa)
Não, não são entraves
São só limites.
Eu era só aquele que te amava
Em qualquer tempo ou lugar
Na frente de tudo
Na frente de todos
Diante de mim
Eu era só aquele que te amava
Que esperava por um sinal
Um breve olhar
Um mínimo sorriso
Para viver o meu dia
Eu era só aquele que te amava
Que comemorava tuas vitórias
Tais como se fossem minhas
E ficava eufórico em te ver crescer
E em de alguma forma te fazer feliz
Eu era só aquele que te amava
Sem julgamentos ou motivos
Sem limites ou barreiras
Amor daqueles brutais
Amor de todas as maneiras
Eu era só aquele que te amava
Que se importava
Que chorava e sorria
Que era poesia
Que era lido e guardado
Eu era só aquele que te amava
Que fazia do impossível
Sempre, sempre possível
Para te ter ao meu lado
Para te fazer feliz
Eu era só aquele que te amava
Eu era só.